Público - 2 Fev 04

José Lutou por Filho Que Maria Decidiu Não Ter
Por B.W.

Ainda não tinham passado quatro meses do início do namoro quando Maria (nome fictício), na altura com 21 anos, dá a notícia: "Estou grávida". De repente, o mundo do casal desmorona-se e "tudo é um problema". Maria não é efectiva na empresa onde trabalha, o relacionamento amoroso é recente, as famílias não vão apoiar... "Agimos por desespero", lembra o namorado, José (nome fictício), hoje com 23 anos. A solução é uma só, chama-se interrupção voluntária da gravidez, "é o nome mais suave que se dá ao aborto", ironiza.

Só que José começa a ler, a investigar na Internet. Quanto mais lê, mais acredita que abortar será um erro. "O que nos levava a querer fazer aquilo não era a falta de meios, mas o medo de enfrentar uma situação nova. O aborto era a solução mais fácil, mas se o fizéssemos o trauma seria muito maior", analisa.

Perante aquilo a que José chama "consciencialização", ele e a namorada desentendem-se, ela mantém a mesma opinião, ele não. "Eu dizia de tudo, ia buscar coisas à Net, ajoelhava-me a pedir-lhe que caísse nela", recorda. Mas ela tem o apoio da irmã mais velha, que a mantém consciente de todos os inconvenientes de ter um filho naquela altura da sua vida.

José acaba por perder a batalha quando a namorada o abandona e sai da sua casa, em Gaia. Um dia, Maria liga-lhe, está numa clínica, no Porto, onde vai abortar. "Fui à PSP, à Polícia Judiciária, ao Ministério Público. Fui à clínica e fiz um escândalo tão grande...".

José desespera, quer que o Ministério Público lhe dê poder sobre o filho que a namorada traz no ventre, mas não há lei que preveja tal situação, lamenta. "Quando aquelas meninas escrevem na barriga 'Aqui mando eu' esquecem-se que um bebé não se faz sozinho. O homem é impotente para fazer seja o que for e eu sofri muito por não poder fazer nada", reflecte.

A sua única vitória é, graças à denúncia, a clínica fechar poucos meses depois. Não foi naquele dia, mas noutro. Maria atravessa a fronteira e acaba por cumprir a sua decisão em Espanha. Pouco tempo depois, liga a José, precisa do seu apoio, chorava-lhe ao ouvido. Maria está arrependida. Ainda hoje chora quando vê um bebé, martiriza-se a pensar se seria menino ou menina.

"O sofrimento é bem maior do que se tivéssemos tido aquele filho". José não condena a namorada, ela "acreditou que aquela era a solução", explica. Hoje, passado um ano, continuam juntos e o maior sonho de Maria é voltar a engravidar.

Regularmente, o casal volta ao tema aborto. Falam sem se recriminar, falam "de uma forma diferente", fazem-no também para ajudar outras pessoas que já passaram pelo mesmo ou que ponderam vir a fazê-lo. Maria e José colaboram com uma associação pró-vida. "Fazemos isto porque o coração nos obriga", precisa José.

[anterior]