Diário de Notícias - 25 Fev 04

Os jovens começam cada vez mais cedo a consumir cocaína
MANUELA PAIXÃO

Têm só 12 anos. Inconscientes, ainda crianças, mas já iniciados na droga. Inalam a cocaína, ignorando os seus perigos. Brincam como se fosse pó para espirrar e com a mesma infantilidade e inconsciência com que, durante o Carnaval, atiram o pó de talco para a cara das pessoas.

Aqueles casos são ainda pouco frequentes, mas revelam que a iniciação da cocaína em Itália começa cada vez mais cedo, nos primeiros anos do liceu. Este pode ser um dado desconhecido dos professores e pais, mas é a conclusão de um estudo realizado pelo Instituto Superior de Saúde, para o qual foram inquiridos dois mil toxicodependentes, apresentado em Roma, num seminário mundial que reúne 3000 psiquiatras durante três dias.

«As crianças não têm consciência da gravidade do que fazem, até porque é um "amigo" mais velho que normalmente oferece a primeira dose. Não sabem que a cocaína, mesmo a que é inalada, é tão perigosa para a saúde como a heroína. Isto acontece porque identificam a toxicodependência apenas com a heroína e a seringa. Mas o que sabemos é que aumenta o consumo de estupefacientes não só nos lugares de encontro - discotecas, bares -, mas também em casa. Ao contrário da heroína, a cocaína não é a droga dos marginais», refere Teodora Macchia, coordenadora dos Estudos sobre Substâncias Toxicodependentes.

«A cocaína não é oferecida pura aos mais novos - é misturada para ser mais barata -, mas é igualmente perigosa para a saúde, porque tem anestésicos. Assim, ao efeito estimulante da droga acresce o efeito alucinogéneo», acrescenta aquela técnica.

O tema de debate do segundo dia do congresso, ontem, debateu a relação entre o consumo de estupefacientes, o desporto e as doenças psiquiátricas e cardiovasculares, numa sessão presidida por Marcello Chiarotti, catedrático especializado em toxicologia. Foram apresentados dados sobre enfartes e arritmias e estudos em como a euforia e a excitação dão lugar à depressão, quatro ou cinco horas depois.

«É impossível continuar a enfrentar o problema da cocaína apenas como uma toxicodependência. É necessário que os médicos e os técnicos hospitalares se actualizem sobre os seus efeitos e danos cardiológicos. Ainda tenho um electrocardiograma de um rapaz de 20 anos que chegou às urgências do hospital de Forli, numa manhã de domingo. Apresentava uma hipertrofia no ventrículo esquerdo e sinais de grande deficiência coronária, como se fosse um homem de 70 anos. Tinha "snifado" cocaína à saída da discoteca. Ainda hoje quando falo desta droga, mostro este electrocardiograma», disse ao DN Ubaldo Mengozzi, ex-presidente da Sociedade Italiana de Medicina de Emergência.

«Sim, consumo cocaína. Para mim, é uma questão de imagem. Não posso recusar participar em determinada festa só porque sei que acabará com droga. Sou bailarina e, neste ambiente, somos postos de lado se mostramos certo tipo de atitudes», respondeu Maura, 19 anos, interrogada pela polícia num processo sobre cocaína, em Roma, que escandalizou o país e envolveu um ex-primeiro-ministro, ex-ministro do Exterior e fundadores históricos da Democracia Cristã, senador Perpetuo, que confessou ser toxicodependente de cocaína. «É necessário informação médica sobre os efeitos das drogas. Enquanto que a heroína provoca insuficiência respiratória, a cocaína actua sobre um neurotransmissor, a dopamina, com um efeito exaustivo nas células nervosas, reduzindo a capacidade do organismo de produzi-la. É isto que causa a dependência e, na hora que se segue ao consumo de cocaína, o risco de enfarte é 24 vezes superior ao normal», explicou o professor Paolo Zeppilli, director da Escola de Medicina Desportiva. «Muitos jovens tomam cocaína para estudar durante os exames e estarem acordados toda a noite. Quem a usa deve ser informado dos seus perigos para a saúde, em especial para o coração», defendeu Claudio Cirelli.

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