Público - 20 Fev 08

Novo imposto de circulação surpreende milhares de antigos proprietários de veículos
Sofia Rodrigues

Muitos dos antigos donos dos veículos têm de perder horas a cancelar a matrícula, outros não conseguem provar a quem venderam ou que o carro foi para a sucata

José ficou estupefacto quando soube agora que tinha de pagar "40 e tal euros" por um carro que vendeu há 18 anos. Não sabia que o automóvel ainda estava em seu nome e descobriu que a empresa do stand a quem vendeu já nem existe. Agora tem de perder tempo a cancelar a matrícula. Esteve desde as 10h30 nas instalações da antiga Direcção-Geral de Viação, em Lisboa, e tinha uma previsão de ser atendido às duas da tarde. "Uma vergonha", diz José, que só quis revelar o seu primeiro nome.

A situação deste automobilista está a ser vivida por centenas de milhares de outros, desde que entrou em vigor este ano o novo Imposto Único de Circulação (IUC).

O imposto deixou de ser cobrado pela circulação e passou a sê-lo pela propriedade. Só que a base de dados do registo automóvel está muito desactualizada: muitos dos compradores nunca chegaram a declarar a compra do veículo porque custava dinheiro (63 euros) e implicava mais um registo no processo. Ou seja, a viatura ficava em nome do vendedor, sem que este se apercebesse.

Para cobrar o novo imposto, as Finanças acedem agora à base de dados dos registos, o que tem levado a que muitos automobilistas sejam confrontados com um imposto para pagar relativo a carros que venderam há anos.

Para minorar esta situação, o Governo criou um regime transitório que permite regularizar os registos não efectuados. Até ao final deste ano, o proprietário que tenha um carro em seu nome mas que já não é seu pode fazer uma declaração nesse sentido. Este regime transitório só se aplica a casos de vendas anteriores a 31 de Outubro de 2005, o que levou o Automóvel Club de Portugal (ACP) a lançar uma petição on-line.

Confrontados com muitas queixas de sócios, o ACP defende que esta excepção deve ser alargada até 31 de Janeiro de 2008. "Houve precipitação ao criar um imposto - o IUC - cuja cobrança se baseia em registos que não estão actualizados e há um ano que o ACP vem denunciando o caos no registo automóvel dos "usados"", lê-se no texto da petição, que precisa de quatro mil assinaturas para que a situação seja levada à Assembleia da República. O ACP tem, aliás, aconselhado os antigos proprietários a não pagarem o IUC por enquanto.

Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa do Ministério das Finanças não quis acrescentar comentários a este assunto. Quanto a dificuldades, o ministério garante ter indicações de que o pagamento do IUC "está a decorrer normalmente".

Basta uma simples pesquisa no Google para se perceber que há muitas dúvidas sobre como fazer prova de que um veículo já não pertence ao proprietário que consta no registo automóvel. É exigida uma declaração em que consta a identificação do vendedor. Mas há casos de pessoas que já venderam o carro há mais de 20 anos e que não se lembram a quem, tendo sido obrigadas a pedir a apreensão do veículo (que porventura já nem existe). Há ainda casos de automóveis que foram para a sucata há mais de dez anos, mas cujos antigos proprietários não têm documentos. Ao ACP têm chegado relatos de pessoas que tentam a todo o custo encontrar o carro que venderam há anos, assumindo um papel detectivesco.