"A Casa,
para Os Jovens de Hoje, Não É Mais do Que Uma
Paragem de Autocarro"
Por
CATARINA SERRA LOPES
"Há pais que me perguntam quais são os sintomas
da adolescência. Mas desde quando é que a
adolescência é uma doença?" - esta foi uma das
questões levantadas pelo psiquiatra Daniel
Sampaio no decorrer da conferência "3º Toque",
que teve lugar terça-feira à noite na Escola de
Turismo do Estoril, no concelho de Cascais.
Organizada pela Federação de Associações de Pais
e Encarregados de Educação deste município, a
palestra teve como principal tema a integração
dos pais na escola dos filhos e o seu papel
enquanto educadores.
Talvez pelo tema, talvez pela qualidade e
mediatismo dos oradores - Daniel Sampaio e
Marcelo Rebelo de Sousa - foram cerca de 600 as
pessoas que compareceram. Uma clara oposição às
periódicas reuniões de pais, que se pautam
habitualmente pela ausência dos próprios
progenitores.
Num ambiente informal, Rebelo de Sousa e Daniel
Sampaio foram lançando questões um ao outro,
introduzindo temas, confrontando teorias, mitos
e falsas verdades.
Umas vezes respondendo a perguntas da
assistência, outras lançando as suas próprias
provocações, os oradores fizeram a conversa
fluir durante mais de duas horas e meia, num
passeio pela juventude actual, pelos problemas
dos adolescentes, pelo aumento do número de pais
destituídos de um modelo, pela falta de regras
em casa, pela crescente imaturidade de uma
sociedade que cada vez mais retarda a chegada à
idade adulta.
Porque é necessário regras, porque é necessário
modelos claros, "não se pode ser pai com bases
em estratégias educativas ensaiadas ao momento,
seguindo livros e manuais ou o que se acabou de
ver num programa de televisão", segundo explica
Daniel Sampaio.
Porque é preciso, acima de tudo, que "os jovens
deixem de estar desmotivados, no caminho da
felicidade imediata, com muita informação mas
com muito pouca digestão", segundo refere
Marcelo Rebelo de Sousa.
Investir no acompanhamento dos filhos
"A casa, para os jovens de hoje, não é mais que
uma paragem de autocarro, muitas vezes não há
sequer uma refeição diária conjunta com a
família", sublinha o professor, acrescentando
que "toda esta ausência causa graves problemas,
pois os pais devem investir no acompanhamento
constante para a prevenção".
Não querendo isso dizer, no entanto, que as mães
precisem de deixar de trabalhar para ficar com
os filhos. "Todas as mulheres que eu conheço que
o fizeram ficaram extremamente rabugentas",
comenta Daniel Sampaio.
Quanto à adolescência, o psiquiatra explica que
"os problemas desta muitas vezes vêm da
infância." "Os pais actuais têm uma dificuldade
imensa em brincar com os filhos. Precisavam de
estar menos preocupados com o seu trabalho, com
a sua saúde mental, com a sua relação conjugal",
explica. Não querendo no entanto isso dizer que
só se deve ser pai quando se tem idade para uma
maior disponibilidade.
"Hoje em dia tenho muitos amigos de 50, 60 anos
que resolvem ter filhos e eu pergunto-lhes
sempre se, para lá do prazer que vão ter em ter
um filho, já se questionaram se o filho irá ter
prazer em ter um pai que provavelmente não o irá
ver a chegar sequer ao secundário", comentou
Marcelo Rebelo de Sousa.
Já para o fim ficou a abordagem do divórcio, um
tema essencial nos dias de hoje. Considerada
como a situação que provoca mais stress numa
família, a separação de um casal é, para Daniel
Sampaio, "uma solução, mas não uma solução boa".
"Hoje em dia há uma grande ausência de reflexão
nos próprios problemas, há uma banalização do
divórcio, o que logicamente afecta as crianças",
disse. Como caminho alternativo, o psiquiatra
aconselha a criação de gabinetes de mediação
familiar que ajudem os casais em crise.
Caso isso não resulte e o caminho escolhido seja
mesmo a separação, pelo menos que seja numa fase
em que seja possível "a separação emocional de
forma a que os dois progenitores consigam manter
uma relação pacífica, para bem da criança",
salienta o psiquiatra. |