Público última hora - 20 Mai 08

 

CNE recomenda mais apoios para a educação das crianças
Isabel Leiria

 

Estudo do Conselho Nacional de Educação alerta para a insuficiência de creches e pede políticas que permitam às mães ficar mais em casa

 

É "insuficiente" a ajuda que o Estado dá às famílias na educação dos 0 aos 3 anos, recomendando-se por isso o alargamento dos apoios destinados às crianças nesta faixa etária. A taxa de cobertura da rede formal de cuidados à 1.ª infância ainda está nos 20 por cento e é difícil que a meta definida pelo Governo de ter uma em cada três crianças abrangidas, até 2010, venha a ser cumprida, alerta-se num relatório do Conselho Nacional de Educação (CNE).

 

stério da Educação apresenta e discute hoje o relatório A Educação das crianças dos 0 aos 12 anos, onde se faz uma análise da oferta educativa do Estado para estas idades e se apontam algumas das fragilidades da organização do sistema de ensino.

 

Começando pelos primeiros anos de vida, os autores do estudo lembram que a evolução da sociedade, com o envolvimento dos pais numa profissão, o valor cada vez maior atribuído à carreira, o aumento das famílias monoparentais e a diluição da família alargada, por exemplo, fazem com que as creches surjam como uma "necessidade imperiosa de apoio".

 

E assumem uma importância acrescida em termos de "coesão social e vivência democrática", num país onde a taxa de pobreza infantil se situam na ordem dos 23 por cento, o desemprego atinge muitas famílias e a imigração "precisa de acolhimento e integração", lê-se nas considerações finais do estudo, redigidas por Isabel Alarcão, investigadora e doutorada em Educação.

 

"As famílias são e devem continuar a ser as primeiras responsáveis pela educação das crianças. Mas as condições de vida das famílias na actualidade requerem apoios, desde a 1.ª infância, que têm de ser pensados numa lógica de complementaridade e não de substituição", defendem os autores do estudo.

 

É que, reforçam, se a lei que rege o sistema educativo (aprovada em 1986) partiu do princípio que é às famílias que compete a socialização primária e a educação das crianças - a escolaridade obrigatória inicia-se aos 6 anos, sendo a frequência do pré-escolar facultativa -, o facto é que este entendimento "não tem sido acompanhado de políticas familiares e de trabalho consoantes com este ideário".

 

Reconhece-se que tem sido feito um esforço no aumento de creches, infantários e amas, mas o seu número é tido como "insuficiente". Além disso, critica-se o facto de o seu funcionamento ser muitas vezes direccionado para a prestação de serviços de apoio à família em termos de protecção social, "com a desvalorização do papel educativo". Uma outra alternativa seria o desenvolvimento de modalidades de apoio promovidas pelas comunidades locais e políticas que "possibilitem à mãe uma maior permanência em casa".

 

A oferta de pré-escolar (dos 3 aos 6 anos) é também considerada "incompleta", com os jardins de infância públicos a dar resposta a apenas 52 por cento dos meninos actualmente inscritos.

 

Sem tempo para brincar

 

Mas se as famílias precisam de apoio, os autores do estudo rejeitam um modelo em que as instituições se substituem por completo, como resposta aos "perigos de uma sociedade cada vez mais atentória da sua fragilidade". "As crianças passaram a estar institucionalizadas, dispendendo muito tempo nas instituições, nos mesmos espaços, o que implica um domínio, pelos adultos, do espaço e do tempo que lhes é próprio, propiciador de brincadeiras de criatividade e regulação autónomas", critica-se no relatório, que conclui que se "passou do vazio ao exagero, sendo necessário harmonizar o tempo do currículo, do lazer e da família".

 

As crianças "desfrutam pouco da riqueza da vida nas comunidades e contactam predominantemente com o elemento feminino, vendo-se assim privadas do equilíbrio entre a quietude normalmente transmitida pelo elemento feminino e a ousadia culturalmente referenciada ao elemento masculino", alertou o pediatra Mário Cordeiro, num workshop relacionado com este tema e citado no relatório.

 

Neste contexto, a pressão passou a recair sobre as instituições, com a sociedade a esperar "da escola o que a escola não está preparada para lhes oferecer ou, quiçá, não deve até esperar que ofereça", lê-se no estudo.