11 de Outubro de 2000 - Público

Rogério Fernandes Ferreira critica proposta de lei do Governo
"Reforma Não Ataca Problemas de Fundo" 


A proposta de lei do Governo, de reforma fiscal sobre a tributação do rendimento, cuja discussão se inicia hoje no Parlamento, não é a solução para os problemas de injustiça existentes há mais de uma década, porque "não ataca os problemas de fundo", sustenta o fiscalista Rogério Fernandes Ferreira. 

Na sua opinião, a proposta "mantém o sistema", corrige algumas situações, e, sobretudo, dá sinais para a sociedade no sentido de sensibilizar os contribuintes. Em suma, tratam-se de "actos de boa vontade, simpáticos, mas não as soluções". É uma "mudança válida", "são caminhos, mas não são mudanças profundas". 

Rogério Fernandes Ferreira, entre outras responsabilidades, coordenou recentemente o grupo de trabalho nomeado pelo anterior ministro das Finanças, António Sousa Franco, para remodelar o IRS. As suas ideias, acumuladas ao longo de muitos anos de experiência e de muitas propostas estudadas, serão mais radicais, embora admita que o objectivo oficial não é realizar uma revolução. Mesmo o relatório do seu grupo de trabalho, respeitando o "caderno de encargos" oficial, não propôs mudanças radicais, mas apontava os cancros da tributação, em que um mesmo rendimento é tributado desde 40 por cento até estar isento. 

Neste caso, a reforma não altera essa situação, mas, como afirmou, pretende atenuar camadas castigadas, proceder à correcção das contribuições dos que não declaram o que deviam (profissionais liberais, comerciais, etc). Só que, "simplesmente, são medidas que atenuam" a actual situação. "Do ponto de vista estrutural, mantêm o sistema", disse. 

A reforma do património ainda está por fazer. As medidas tendentes a controlar os "offshores" fiscais ou a flexibilizar o sigilo bancário, "possivelmente, é o que é possível, mas os problemas mantêm-se". Mesmo o combate através dos sinais exteriores de riqueza arriscam-se a não resultar. "Em geral, os carros de luxo e as casas não estão em nome das pessoas singulares", mas de sociedades, possivelmente sediadas em "offshores". "Há uma indústria de offshore e não se faz nada", afirma. E como não se pode fazer, quanto à banca, mexe-se nas provisões "para tentar apanhar uma talhada dos lucros". 

Além disso, em vez de baixar simplesmente as taxas de IRS, o Governo continua a mexer nas deduções. Ou seja, é "mais papelada e põe os contribuintes apegados a pagar menos e indevidamente", contribuindo para que "a forma de tributação seja um jogo". 

J.R.A. 

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