22 de Setembro de 2000 - www.forumhso.pt

Famílias e orçamento

Fernando Castro

Estamos em plena discussão parlamentar do Orçamento Geral do Estado.

Naturalmente, é grande a expectativa das famílias portuguesas, para ver que promessas é que vão de facto ser cumpridas.

Como Presidente da Direcção da APFN - Associação Portuguesa de Famílias Numerosas espero que algumas das nossas reclamações, nomeadamente no domínio fiscal, sejam satisfeitas, depois das declarações proferidas pelo Primeiro Ministro no início do mês de Julho acerca desta matéria. Essa esperança é reforçada pelas exigências que os líderes do CDS-PP, PSD e BE têm vindo a fazer desde essa data.

Gostaria de aproveitar para esclarecer alguns pontos:

A APFN não é contra ou a favor do Governo, como não é a favor ou contra qualquer partido ou formação política, nem a favor ou contra a Igreja Católica ou qualquer outra confissão religiosa.

Como acontece com qualquer outra associação, temos sócios de diversas orientações políticas e religiosas, com o mesmo objectivo comum de defender os legítimos interesses das famílias com três ou mais filhos.

Os interesses das famílias com três ou mais filhos são exactamente os mesmos das famílias menos numerosas. A grande diferença reside apenas em que, por serem mais numerosas, os problemas que se põem na e à família atingem uma intensidade bem maior.

E a primeira questão prende-se, precisamente, no que é família.

Constitur família consiste no acto de homem e mulher casarem-se, de onde poderão surgir os seus filhos.

Esta não é a única forma de convivência humana. Existem, como sempre existiram, muitas outras. Mas não chamem família! Chamem outra coisa qualquer!

E, por favor, não misturem Igreja com família!

A família é resultado de uma evolução feita ao longo da história da humanidade, com altos e baixos... e a Igreja só existe há 2000 anos.

A história ensina-nos que os tais baixos da família sempre arrastaram essa sociedade para a destruição. Pelo contrário, o fortalecimento das famílias sempre conduziu a sociedades fortes, capazes de suportar as diversas pressões a que foram sujeitas.

Mesmo que não sejamos bons em história, basta vermos o que se passa na actualidade: a maior incidência de famílias doentes ou desfeitas está a provocar uma maior violência no seio da sociedade, em nítido processo de auto-destruição, à semelhança do que aconteceu noutras sociedades da antiguidade.

Custa-me imenso ver pessoas aparentemente tão inteligentes terem tanta dificuldade de ver as coisas óbvias e, ainda por cima, defenderem outras formas de convivência humana como sendo muito modernas e progressistas, atacando a família e quem a defende como se fosse um bando de atrasados mentais.

Mas essas pessoas não têm família? Será que são filhos de mãe hospedeira inseminada artificialmente?

Será que são cegos e surdos? Não vêem os resultados que têm sido obtidos com a degradação da família nos países que iniciaram esse processo muito antes de nós e que, agora, estão a fazer marcha-atrás a toda a força?

É necessário nós passarmos por esse processo, quais parolos que vão atrás dos outros sem saber para onde vão, ou não será melhor ficarmos parados à espera que eles venham ter conosco?

A família é o elemento essencial da sociedade.

As famílias portuguesas são os alicerces da sociedade portuguesa.

O seu enfraquecimento inevitavelmente tem conduzido ao enfraquecimento desta sociedade.

Será progressismo defender algo que, em vez de trazer progresso, traz degradação?

Vejamos alguns exemplos:

1 - Toda a gente que se casa, fá-lo para ser feliz com aquele ou aquela que escolheu como cônjuge. Não há ninguém que se case a prazo. Mas, o que é certo, é que um crescente número de casamentos, actualmente 1 em cada 4, terminam em divórcio.

E qual tem sido a resposta do Estado: fazer com que o divórcio seja cada vez mais simples... e com que uniões de facto sejam equiparados ao casamento.

Mas será que está tudo doido?

Se aumentar o número de acidentes mortais nas estradas portuguesas, o que o Estado vai fazer é apenas aumentar a eficiência das agências funerárias, e, simultaneamente, equiparar os condutores com carta aos simples condutores de facto? E, de forma cínica, dizer que a forma como quem conduz é do foro íntimo de cada um?

O Estado ainda não percebeu que a família não é, de forma alguma, do foro íntimo de ninguém?

O Estado ainda não percebeu que está a gastar rios de dinheiro a combater, sem sucesso, coisas que não são mais do que frutos da degradação da família?

Terá, com certeza, muito mais sucesso, se parte dessa verba fôr investida no fortalecimento das famílias, dando formação aos noivos e aos casais, aumentando o número de pólos de assistência a casais em dificuldade de relacionamento, dando melhores condições de vida e deixando de persegui-las fiscalmente.

A APFN tem vindo a levar a efeito uma série de conferências de modo a alertar a opinião pública para estas questões.

A última "Família e Fiscalidade", realizou-se no passado dia 1 de Junho, e demonstrou como a fiscalidade é anti-família, apesar de a Constituição consagrar no seu artigo 67 que é o elemento fundamental da sociedade.

Só para citar algumas das conclusões:

1 - O IRS é um imposto injusto, incoerente e promotor de desigualdades.

Citando apenas algumas situações de flagrante incoerência e injustiça:

O IRC permite deduzir todas as despesas das empresas que sejam necessárias para o seu funcionamento.

Pelo contrário, o IRS, apesar de estar consagrado no art 67 da Constituição que a família é o elemento fundamenal da sociedade, não permite deduzir as despesas mais elementares para a sobrevivência dos elementos que fazem parte da família.

Por exemplo, porque motivo existe uma dedução de 27.950 escudos por cada sujeito passivo (55.900 por casal) mais cerca de 20.000 por filho? Os 76.00 por dia destinam-se a quê? Porque motivo a dedução não é igual, pelo menos, ao salário mínimo anual, por elemento da família? A família não tem que beber, comer e vestir-se, pelo menos? E não tem que pagar habitação, transportes, electricidade, a educação dos seus filhos, etc? Ou isto são luxos?

Por que motivo a taxa máxima do rendimento do trabalho é de 40% e do rendimento de capitais é de 20%? Porque o Estado considera que só trabalha quem não sabe fazer mais nada, e que há que carregá-los com impostos para estimular a sua imaginação?

Por que motivo o limite do seguro de doença é de 27.200 Escudos por ano independentemente da dimensão da família?

Por que motivo as despesas de educação penalizam as famílias numerosas?

Se, numa empresa, o toner e o papel de uma fotocopiadora, assim como a sua manutenção e todas as reparações, são deduzidas do rendimento colectável, porque é que a alimentação, vestuário, saúde, educação, etc, não são deduzíveis no IRS, ou são-no apenas em quantidades irrisórias? Para o Estado, uma pessoa vale menos que uma fotocopiadora?

2 - O IA é injusto e incoerente

Por que motivo viaturas de sete lugares não têm todas o mesmo IA? Para obrigar as famílias numerosas a poderem apenas escolher entre um número limitado de viaturas existentes no mercado?

3 - A SISA é injusta e incoerente

Por que motivo ainda existe SISA? E porque é suportada pelo comprador, que normalmente tem que recorrer a um empréstimo bancário para concretizar a aquisição, e não pelo vendedor?

O fim da SISA está prometido há cinco anos, desde a campanha eleitoral para o governo anterior! Porque é que o governo cumpriu a promessa de acabar com as portagens na CREL, e ainda está à espera de cumprir esta? Para continuar a atirar para o ar essa promessa sempre que aumenta a contestação?

4 - A contribuição autárquica penaliza as famílias numerosas

Por que motivo a contribuição autárquica não entra em linha de conta com a dimensão da família?

De que é que o governo está à espera para cumprir a Resolução do Conselho de Ministros de 9 de Fev 1999, onde definiu a sua política familiar, nomeadamente a criação do cartão de família numerosa? É muito difícil?

Num ano, um grupo de casais criou a associação e já conseguimos várias facilidades para quem tem o cartão de sócio. E a direcção é composta apenas por 5 casais em part-time, ainda por cima um “partesinho -time”, porque, para além do nosso trabalho normal, onde temos que trabalhar mais que os outros, ainda temos uma família maior para cuidar e atender.

Será muito difícil umas dezenas de governantes, centenas de deputados e dezenas de milhar de funcionários públicos em full-time , pagos pelas famílias portuguesas, fazerem o tal cartão de família numerosa? Ainda por cima quando já existem registos para o espectacular subsídio familiar?

Em nome da APFN, gostaria de apelar aos partidos políticos com assento parlamentar para procurar estabelecer uma plataforma de sobre política familiar, à semelhança do que recentemente se fez em Espanha. Isto não tem nada a ver com alianças democráticas nem anti-democráticas.

Em particular, apelo a que, no que diz respeito à referida Resolução do Conselho de Ministros interpelem o Governo governo sobre:

Quais os ministérios que são responsáveis porquê?

O que já fizeram e quais os timings previstos até 9 de Fev de 2001 

[anterior]