Manipulação de Massas
Ficamos sempre espantados com os
fenómenos de manipulação de massas. Como é possível que em
tantas ocasiões tantas pessoas sensatas acreditem piamente em
disparates óbvios? Das patranhas nazis às fábulas do «mar
tenebroso» e a tantos outros casos, culturas inteiras caíram em
erros fantásticos. Mas se considerarmos o que se passa hoje, se
olharmos para as manipulações da nossa cultura, percebemos um
pouco melhor como uma tolice muito repetida pode parecer
razoável.
Um caso evidente é o do aborto. Ao
longo de séculos, todas as civilizações sempre souberam, com
absoluta certeza, que o aborto é um crime hediondo. Nunca foi
preciso explicar porquê. Hoje a cultura ocidental, pela primeira
vez na História, gerou uma vasta, elaborada e falaciosa retórica
para demonstrar exactamente o oposto. E, apesar do progresso e
da ciência, muito boa gente cai de novo na armadilha.
A forma como funcionam estes
processos de sugestão de massas é muito curiosa: sempre com dois
elementos, uma base verdadeira e uma distorção subtil. As
manipulações partem sempre de um elemento autêntico e
perturbador. Por exemplo, a humilhação da Alemanha invocada
pelos nazis era dolorosamente real. Também a fúria das
tempestades oceânicas motivava as lendas dos navegantes. Tudo
nasce de um facto indiscutível. No aborto ninguém nega o drama
horrível das pessoas envolvidas. Estes casos vêm sempre
mergulhados numa enorme dor.
A manipulação introduz depois um
ardil engenhoso. Os nazis partiam da miséria para impor a
vingança e a necessidade da sua ditadura; os marinheiros viam
monstros nas ondas. Também no aborto há um artifício elementar.
A ideia básica é a identificação da gravidez com uma doença
cancerosa. A questão passa então a ser apenas de saúde pública:
a forma mais higiénica e segura de retirar o embrião. Como
resultado multiplicam-se os longos discursos, os elaborados
raciocínios, os vigorosos debates sobre a questão, sem nunca
referir o elemento mais evidente: está ali um bebé.
Toda a gente sabe que está ali um
bebé, mesmo que finja ignorá-lo. Aliás, a razão porque se quer
fazer o aborto é precisamente por causa da criança. Se não fosse
uma criança, não seria precisa a difícil operação, pois a
gravidez em si não traz risco de maior. O motivo da brutal
intervenção sobre o corpo da mãe é, não que aquilo seja um tumor
prejudicial à sua saúde, mas que, se não se fizer nada, daqui a
umas semanas sai dali alguém que sorri, chora e mama.
Matar um bebé inocente ainda é na
nossa cultura um crime infame. Por isso é precisa a manipulação
para não se falar nisso, para omitir o facto. Deste modo o
aborto, mascarado como direito fundamental para a Esquerda e
liberdade individual para a Direita, é hoje defendido por ambos
os lados. Inimigos figadais noutros temas, os extremos estão
unidos paradoxalmente, para apresentar como valor fundamental
essa abominação suprema.
tolice chegou ao ponto de se ouvir
acusar como «extremista» e «fanático» quem apenas aponta o
óbvio: o aborto impede um bebé de nascer. O mais significativo é
que também trataram assim aqueles que no passado se opuseram à
escravatura, à pena de morte e à discriminação da mulher. E o
problema aqui é exactamente igual: recusar a alguém, ao embrião
como ao escravo, o estatuto de pessoa humana. As gerações
futuras terão tanta dificuldade em nos entender como nós em
aceitar esses horrores antigos.