Morte,
sofrimento e família em debate
«Família e amor, na doença e na
morte» foi o tema do colóquio, promovido pela APFN (Associação
Portuguesa das Famílias Numerosas) e ADAV (Associação de Defesa e
Apoio à Vida), realizado no dia 14 de Maio, no CUFC. Sob o tema
global, foram analisados, em pormenor, os aspectos éticos e
jurídicos associados à eutanásia, pelo Doutor João Carlos Loureiro,
os cuidados paliativos, pela Dra. Edna Gonçalves, e os apoios que a
Segurança Social proporciona às famílias com situações de doença ou
velhice, pela Dra. Emília Carvalho.
Num momento em que as violações da
vida e as relações entre família e doença se tornaram assunto do
quotidiano, com as histórias de Terri Schiavo e Ramón Sampedro, este
colóquio foi uma oportunidade para situar ética e juridicamente a
eutanásia. Para tal, o Doutor João Carlos Loureiro, professor na
faculdade de Direito de Coimbra, situou o problema no quadro mais
amplo da sociedade em que nos movemos. Uma sociedade marcada pela
hipervalorização da autonomia do indivíduo, pelo culto do corpo,
sustentado por um novo fundamentalismo estético, alimentada por uma
hipervalorização da imagem. Uma sociedade, definida, ainda, por
coleccionar vivências, em lugar de valorizar a experiência, que se
traça no quadro de um projecto de vida mais global. Tais traços
denunciam o eclipse da razão e a sobrevalorização da comunicação e
mediatização, suportada por relações de sedução, conducentes a uma
transformação da própria experiência religiosa, marcada pela
multiplicação das espiritualidades, com correspondente crise do
legado judaico-cristão.
Neste quadro, prosseguiu-se o
debate, denunciando que, nesta discussão sobre eutanásia, os termos
e conceitos têm sido baralhados, para provocar uma confusão que
torna inviável o esclarecimento e conduzir a decisões que se têm
revelado penalizadoras da vida humana fragilizada. Assim, ficou a
nota de que, ao falarmos de eutanásia, o que está em causa, e é
relevante, é a finalidade pretendida com os cuidados médicos
administrados, a fim de discernir se determinado acto é devido ou
não. E se o é, a eutanásia definir-se-á como o incumprimento de um
cuidado médico devido.
O enquadramento ético e jurídico
da eutanásia permitiu compreender a legimidade de se falar dos
cuidados paliativos, uma vez que, no entender da Dra. Edna
Gonçalves, os dados permitem confirmar que, ao realizar este tipo de
cuidados que acompanham quem vive com uma doença terminal, os
pedidos de eutanásia são praticamente inexistentes, pois há toda uma
abordagem da dor e do sofrimento que permite que o indivíduo,
família e comunidade se sintam envolvidos num projecto comum,
revalorizando a vida na sua fragilidade.
O colóquio permitiu, ainda,
observar como os desafios à Segurança Social continuam a ser muitos,
pois os dados analisados conduzem à consciência de que o apoio às
famílias que se deparam com a doença e o envelhecimento
incapacitante estão longe de poder receber todo o auxílio de que
necessitam. A título de exemplo, registou-se o facto de que,
havendo, no distrito de Aveiro, 32,8% de pessoas com mais de 65
anos, a taxa de cobertura da Segurança Social ser de, apenas 9,8%. O
desafio deixado pela Vice-Presidente do Centro Regional de Aveiro
foi o de se mudarem mentalidades, que conduzam as famílias no
sentido da sua organização autónoma.
Luís Manuel Silva
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