Público - 20 Dez 02

Alta-Autoridade e ICS Têm Os Dias Contados
Por MARIA LOPES

Nova entidade reguladora

Se a Constituição não for revista, a AACS coexistirá com a entidade a criar. Integração de competências actualmente dispersas será progressiva

O modelo proposto pelo Governo para uma futura entidade reguladora do audiovisual implica o desaparecimento do Instituto da Comunicação Social (ICS) e a extinção ou esvaziamento das competências da Alta-Autoridade para a Comunicação Social (AACS).

De acordo com o texto do documento "Novas Opções para o Audiovisual", apresentado esta semana pelo ministro da Presidência, Nuno Morais Sarmento, o novo modelo de regulação assentará numa "única instância reguladora" que irá concentrar "o maior número possível de competências de regulação", actualmente dispersas.

Tal concentração de responsabilidades implicará também "a diminuição das competências do Instituto do Consumidor e da Comissão de Aplicação de Coimas em Matéria Económica e Publicidade". A Autoridade da Concorrência terá, por sua vez, que ter em conta os pareceres da futura entidade e o ICP-ANACOM poderá vir a ser integrado nela, numa segunda fase.

A extinção da AACS está, no entanto, dependente de uma revisão constitucional que contemple o desaparecimento deste organismo. Caso isso não aconteça, o Governo retirar-lhe-á as competências que derivam da lei ordinária (nomeadamente as de cariz administrativo), ficando apenas "com as que resultam da Constituição", disse em entrevista ao PÚBLICO Morais Sarmento. Se, pelo contrário, houver revisão da Constituição, "poder-se-á fazer evoluir a AACS no sentido da convergência e da sua integração na estrutura administrativa da nova entidade reguladora única", lê-se no documento.

O ministro preferia um cenário com "uma só entidade reguladora". "Mas se não puder ser não é", acrescenta. O responsável da tutela afirma querer "trabalhar num modelo construtivo, com o PS, que tinha a mesma opinião no sentido de fazer uma única entidade reguladora."

"É bom para que sejam cumpridos os limites de publicidade, conteúdos europeus, conteúdos de língua portuguesa; para que novas áreas de preocupação que não estão muito previstas legalmente como sejam a violência e a pornografia estejam efectivamente regulamentadas. Para que uma ética de antena seja afinal controlada", justifica o ministro.

Regulação dos mercados e protecção dos cidadãos

A nova entidade terá um carácter multifuncional, e as suas responsabilidades dividem-se em duas vertentes: a de "regulação e supervisão dos mercados" e de "protecção dos cidadãos" - ou seja, de conteúdos. Tal inclui um leque diversificado de poderes que compreendem "a capacidade de emitir recomendações ao Governo, definir estratégias e políticas de regulação, supervisionar o bom funcionamento do sistema, fiscalizar o incumprimento das normas de regulação, punir as infracções". Prevê-se mesmo rever o actual quadro de sanções, procurando um sistema "que seja realmente dissuasor da infracção". Além do aumento das coimas, a punição incluirá a possibilidade de real suspensão e cassação das licenças de operação.

Se a AACS for extinta, à nova instância reguladora caberá também a responsabilidade pelo respeito dos "direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados, nomeadamente o direito à informação, a liberdade de imprensa e a independência dos meios de comunicação social, bem como a possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião, incluindo os direitos de antena, de resposta e de réplica
política".

O caminho para a nova entidade não será curto. A curto prazo, o Governo tenciona constituir, a par do ICP - Autoridade Nacional das Comunicações (ANACOM) uma instância administrativa que se ocupe do supervisionamento dos conteúdos e o funcionamento do mercado do sector dos "media". A concentração de competências deverá ser progressiva e faseada. Num segundo momento, far-se-á a ligação do ICP - ANACOM com esta instância reguladora, através de um órgão de direcção comum. Posteriormente, evoluir-se-á para a integração e fusão completa daquelas entidades numa "super-instância" que intervirá transversalmente na área das infra-estruturas, dos conteúdos e da concorrência.

Este modelo de evolução foi o aconselhado pelo grupo de reflexão sobre regulação nomeado pelo Governo, que incluiu representantes da RTP, do gabinete do secretário de Estado da Cultura, do ICS, do ICP - ANACOM, e do gabinete do ministro da Presidência.
 

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