Repita-se uma vez mais: o
problema do aborto não é religioso, é moral. A crença religiosa pesa,
por exemplo, em questões como o suicídio. Quem acredita que a sua vida é
um dom de Deus não se sente autorizado a pôr termo a algo que lhe não
pertence, nem a ajudar outros a fazê-lo. Fora desta perspectiva
religiosa, o suicídio é aprovado por éticas de grande dignidade, como a
estóica.
No aborto, o caso é outro. Se está aí em jogo uma outra vida, a da
criança que ainda não nasceu, então é obrigação moral respeitá-la e
dever jurídico protegê-la, como a qualquer vida humana. Ou não se
tratará de uma vida humana? Essa é, claro, a controvérsia. Decerto que,
vivendo na barriga da mãe, a criança que vai nascer não possui
autonomia. Mas um bebé já nascido, com semanas ou meses, também não a
possui. A questão desloca-se, então, para saber a partir de que momento
o feto merece ser protegido como vida humana. Com todo o respeito pelos
que pensam de maneira diferente, é artificial e mesmo arbitrário marcar
x ou y semanas para esse ponto a partir do qual passaria a haver pessoa.
Só há uma resposta lógica: desde o princípio,
desde a concepção.
Dantes, quando apenas no momento do parto se sabia se nascia menino ou
menina, a vida intra-uterina era ignorada. Hoje, com as ecografias
feitas logo no início da gravidez e com todos os meios disponíveis para
seguir o desenvolvimento do feto, existe uma nova consciência quanto ao
ser que ali cresce. Muitos jovens pais e mães valorizam essas imagens:
para eles, são «fotografias» de filhos seus. E já se fazem operações a
fetos na barriga das mães. Parece cada vez mais inverosímil considerar
«aquilo» apenas um monte de células - como
lhe chamaram num debate na RTP.