Expresso - 27 de Janeiro

Autoridade e liberdade de escolha 

João Carlos Espada

Por que não deixam às escolas a escolha do seu projecto educativo e das doutrinas educativas? Por que razão não alargam essa liberdade de escolha às famílias, dando a cada uma um cheque-educação com o qual elas poderiam escolher a escola da sua preferência, estatal, particular ou cooperativa? Por que razão insistem em manter um escandaloso monopólio estatal centralizado, de tipo soviético, sobre o ensino gratuito que é todo uniformemente organizado a partir das directivas do Ministério da Educação?


EM DEFESA da autoridade e da liberdade de escolha - é a tese que gostaria de defender a propósito do recente debate parlamentar sobre violência e indisciplina nas escolas. À primeira vista, a tese parecerá bizarra. Entre nós, e em regra na Europa continental, é costume pensar que os dois termos são antinómicos: quem defende a autoridade deve ser contra a liberdade de escolha e quem é partidário desta será contra a autoridade.

Gostaria de recusar tal oposição: sou partidário da autoridade e da escolha livre. Poderia citar em meu favor uma longa lista de autores distintos: John Locke, David Hume, Adam Smith, Edmund Burke, James Madison, Alexis de Tocqueville, Lord Acton e tantos outros. Mas prefiro citar um professor português do ensino secundário, João Rebelo da Silva, que não conheço pessoalmente, e que declarou o seguinte ao jornal «Público» da passada segunda-feira:

«Vivemos numa ditadura das Ciências da Educação, quase tudo é proibido porque não é pedagógico: não se passa trabalhos de casa, não se pode mandar um berro. Mas quando o aluno diz 'não faço porque não quero', ou insulta, os pedagogos dizem que a culpa não é dos meninos, mas das dificuldades lá em casa. A falta de autoridade é um problema, os docentes sentem-se revoltados».

Eis, numa casca de noz, o diagnóstico mais certeiro sobre os problemas das nossas escolas e a sua origem.

A indisciplina e a violência nas escolas são obviamente produto de muitos factores. Mas, dentro das escolas, elas são sobretudo produto de rebuscadas teorias educativas - as tais «Ciências da Educação» - que têm como objectivo central demolir toda e qualquer forma de autoridade que não a delas próprias: a autoridade dos pais, a dos professores, a da polícia, a das leis, e por aí adiante.

Não há aqui espaço para discutir em detalhe essas teorias, mas também não é necessário. Só faço uma pergunta: por que razão é que essas teorias educativas - que, como diz João Rebelo da Silva, minam a autoridade do professor na escola - se socorrem da autoridade central do Ministério da Educação para serem uniformemente aplicadas a todas as escolas?

Por outras palavras: por que razão não praticam os teóricos da educação a liberdade de escolha que pregam a torto e a direito? Por que razão não deixam a cada escola a escolha do seu projecto educativo e das doutrinas educativas consonantes com esse projecto? Por que razão não alargam essa liberdade de escolha às famílias, dando a cada uma um cheque-educação com o qual elas poderiam escolher a escola da sua preferência, estatal, particular ou cooperativa? Por que razão insistem em manter um escandaloso monopólio estatal centralizado, de tipo soviético, sobre o ensino gratuito que é todo uniformemente organizado a partir das directivas do Ministério da Educação?

Mas há mais perguntas: por que razão não divulga o Ministério da Educação as listas que possui com os resultados das escolas nos exames nacionais? Por que razão não deixa as famílias saberem quais são as melhores e as piores de forma a poderem escolher as melhores ou influenciar as piores para seguirem o exemplo das melhores?

A resposta mais plausível é a seguinte: porque os teóricos da «anti-autoridade» temem que, se as famílias pudessem realmente escolher as escolas, elas iriam a correr para as escolas que preservam padrões de autoridade e disciplina.

Dir-me-ão que esta acusação não está provada. É verdade. Mas é muito fácil submetê-la a prova: deixem as famílias escolher as escolas e acabem com o sistema soviético de monopólio estatal sobre as escolas gratuitas. É tão simples como isso. O resto, literalmente, é conversa.

E-mail: jcespada@netcabo.pt
 

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