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Expresso - 25 Jan 03
Televisões por maus caminhos
A RTP tem vindo a aumentar a audiência melhorando a qualidade, o que prova
aquilo que sempre afirmámos: que o caminho seguido pela televisão pública nos
últimos dez anos, copiando as estações privadas e apostando em programas «popularuchos»,
era um erro.
Entretanto, no momento em que isto acontece, observa-se nos canais privados, TVI
e SIC, um verdadeiro vendaval de mau gosto.
E chamar «mau gosto» a certos programas que actualmente vão para o ar a «horas
normais» nestas duas estações é pouco.
Programas como Levanta-te e Ri, Vidas Reais ou Bombástico são verdadeiras
descidas aos infernos, incursões naquilo que o ser humano tem de mais «rasca».
Os canais comerciais parecem ter enveredado por uma lógica de mera captação
instantânea de audiências, não cuidando da sua imagem no mercado e no país.
Ora a imagem de uma estação televisiva faz-se de duas coisas, tem duas
vertentes: as audiências e o tipo de programação.
Uma televisão de qualidade mas sem audiências é inviável.
Porém, uma televisão com audiências mas desqualificada também não tem futuro.
Um canal pornográfico, por exemplo, por maior audiência que tenha, nunca será
muito atractivo para os anunciantes - visto que os produtos nele publicitados
ficam associados a uma imagem socialmente negativa.
O mesmo acontece com os programas de que estamos a falar.
Parecendo dirigir-se não a pessoas mas a bandos de primatas, colocam as imagens
dos canais numa fasquia muito baixa.
Com um risco suplementar.
A imagem da SIC fez-se à custa de duas coisas: de uma programação popular e de
uma informação agressiva mas respeitada.
Sempre que era criticada, a SIC invocava a sua informação como uma marca de
qualidade.
Ora programas como o Bombástico, deliberadamente situado na fronteira entre
informação e entretenimento (se àquilo se pode chamar entretenimento), acabam
por salpicar de lama a informação da SIC - atingindo em cheio a
matriz do canal.
E uma das coisas mais arriscadas para um meio de comunicação é pôr em causa a
sua matriz.
É tempo, pois, de as estações privadas arrepiarem caminho.
A presente estratégia de abaixamento da qualidade a níveis nunca vistos pode ser
rentável a curtíssimo prazo - mas estrategicamente é suicida.
Não se trata já de uma questão moral ou da defesa de um mínimo de dignidade.
Trata-se da própria sobrevivência dos canais privados.
P.S. - Este texto foi escrito antes da emissão de ontem à noite do Bombástico,
para o qual se anunciavam algumas correcções editoriais
[anterior]
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