Público - 29 Jan 03

Magistratura Pede Aos Políticos Que Agravem Multas Contra Televisões
Por PAULA TORRES DE CARVALHO

Consenso entre juizes

Apelo unânime à aprovação de uma nova lei que puna as estações infractoras consoante os lucros

O Conselho Superior de Magistratura (CSM) manifestou, ontem, por unanimidade, a "conveniência" de introduzir na lei uma "indemnização punitiva nos casos de violação de direitos de personalidade cometida através da televisão". A deliberação foi tomada pelos juizes durante a sessão extraordinária do seu órgão máximo, marcada para tomar posição sobre o programa Bombástico na SIC.

"É preciso sensibilizar o poder político para a necessidade de fazer legislação para punir as televisões com indemnizações", disse ao PÚBLICO o juiz conselheiro Noronha de Nascimento, vice-presidente do órgão judicial.

As indemnizações punitivas destinam-se a penalizar as empresas infractoras, tendo em conta os lucros. Actualmente, são apenas indemnizados os danossofridos pelas pessoas.

O Bombástico, que tem vindo a criticar decisões judiciais de casos considerados chocantes, foi definido pelos magistrados como um programa "que vem achincalhando e denegrindo tribunais e juizes no exercício das suas funções, apoucando decisões e instigando, até, os destinatários à justiça pelas suas próprias mãos como forma substitutiva da justiça do Estado".

Os juizes debateram a existência de uma eventual infracção ao artigo 21º da Lei da Televisão, que interdita qualquer emissão que atente contra a dignidade da pessoa humana e incite à prática de crimes. No caso de entenderem que essa violação se verifica, colocam a hipótese de aplicar a sanção acessória de suspender temporariamente a transmissão do canal televisivo, como está previsto na mesma lei.

"Os programas em causa atingiram um tão baixo nível que constituem uma gravíssima ofensa à dignidade, ao bom nome e à credibilidade dos tribunais, órgãos essenciais ao regular funcionamento da democracia e do Estado de direito", consideram os magistrados judiciais em comunicado divulgado, ontem, após a reunião do CSM. "Se a auto-regulação dos jornalistas e autores de programas televisivos não funciona e resvalou para a difamação, deve o Estado, em defesa das instituições, intervir eficazmente para pôr cobro a esta tendência, que corrói a confiança nos tribunais e mina os fundamentos do Estado de Direito", acrescenta este documento.

O Conselho Superior de Magistratura, presidido pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça, é o órgão máximo de controlo dos juizes, responsável pela sua colocação e tutela disciplinar. É composto por sete membros eleitos pela Assembleia da República e dois designados pelo Presidente da República, além de oito magistrados judiciais.

A polémica acerca de programas que, como o Bombástico, criticam o meio judicial foi, entretanto, reforçada, com o protesto de uma das listas candidatas à direcção do sindicato dos magistrados do Ministério Público. A actual direcção tem-se recusado a tomar posição sobre o assunto. Agora, a lista B resolveu manifestar-se e considerou "lamentável" que algumas estações televisivas estejam a emitir programas que, alegadamente, põem em causa as instituições do Estado de direito democrático. Para Luís Sotto Mayor Felgueiras, "as decisões dos tribunais são passíveis de crítica pelos cidadãos, mas não podem ser alvo de programas de televisão que incentivam à desobediência e ao crime".

Este magistrado lamenta que a actual direcção do sindicato não tenha tomado posição sobre a matéria. Na sua opinião, os programas do tipo do Bombástico são preocupantes, já que "na sociedade actual os 'media', e em particular a televisão, têm grande poder junto da opinião pública"..

Luís Felgueiras apelou ainda à Alta Autoridade para a Comunicação Social para que intervenha e peça moderação ao sector.

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