Diário de Notícias - 25 Mar 03

No 'Guiness'
Francisco Sarsfield Cabral

Em Portugal, 76 por cento das casas são propriedade das pessoas que as habitam. A média europeia é de apenas 61 por cento. E há entre nós meio milhão de casas a mais, desocupadas _ sem contar as segundas habitações, de férias ou de fim-de-semana. Somos, então, um país rico, que pode desperdiçar recursos? Não somos, claro. A situação é absurda.

Como o mercado de arrendamento quase não funciona há décadas, a única maneira de arranjar casa é comprá-la. Os empréstimos para habitação cresceram explosivamente nos últimos anos, sendo, de longe, o principal factor do endividamento das famílias portuguesas. Isto significa que muita gente assumiu pesados encargos para a vida, ainda que _ de momento _ as taxas de juro sejam baixas. E significa também que muitos outros ficam excluídos da habitação, por não possuírem capacidade financeira para obter crédito bancário. Ora, não existem casas para alugar a preços acessíveis porque não houve ainda coragem para subir a sério as rendas antigas, muitas delas irrisórias. Por motivos sociais, diz-se. Mas criou-se uma tremenda injustiça social.

O Governo promete rever até Junho a lei do arrendamento. Não precisa de inventar coisa alguma: outros países, como a França, no pós-guerra, ou a Espanha, mais recentemente, passaram por estas dificuldades e ultrapassaram-nas. O presidente da Associação Lisbonense de Proprietários defende a subsidiação das rendas dos inquilinos pobres (DN de 22 de Março). Francisco Louçã, do Bloco de Esquerda, advogou há dias, num colóquio em que também participei, a dinamização do mercado de arrendamento. Já toda a gente percebeu o absurdo da situação. Se, desta vez, as coisas não mudarem finalmente, Portugal entra no «Guiness».
 

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