Público última hora - 03 Mar 09

 

Alerta da Deco
Cada vez mais portugueses com água e electricidade cortadas por falta de pagamento

 

Portugueses que não conseguem pagar as facturas da água, electricidade e gás tornou-se um cenário "cada vez mais frequente", garante a associação de defesa dos consumidores Deco, que atribui a situação à crise económica.

 

Ao Gabinete de Apoio ao Sobre-Endividado da Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor (Deco) chegam cada vez mais casos de consumidores que, quando pedem ajuda, já estão sem água, gás ou electricidade.

 

O corte do abastecimento dá-se por falta de pagamento e, segundo Natália Nunes, da associação de consumidores, revela uma outra "e mais grave" face da crise.

 

"Nos anos anteriores, os consumidores chegavam com dificuldades em cumprirem os pagamentos de outros bens, mas nunca de serviços essenciais como água, electricidade ou gás", contou.

 

Actualmente, são "cada vez mais frequentes" os casos de sobre-endividados que, quando pedem ajuda, já estão há algum tempo sem água, electricidade ou gás.

 

Segundo a EPAL, que abastece a água à população do concelho de Lisboa, os avisos de corte emitidos em 2008 representaram quatro por cento do número das facturas, embora só tenham sido executados 0,3 por cento.

 

A empresa revelou à Agência Lusa que, em 2008, emitiu 3.504.469 facturas, 140 mil cartas de aviso (a dar mais um prazo para ser efectuado o pagamento, antes do corte) e efectuou 10.660 cortes de abastecimento.

 

Nos anos anteriores, foram realizados 9.174 (2007) e 8.069 (2006) cortes.

 

Em Setúbal, são aos milhares os cortes de abastecimento de água por falta de pagamento. No ano passado, deram-se 6.100 interrupções devido a atrasos nas liquidações, segundo revelou à Lusa a empresa Águas do Sado, concessionária dos Sistemas de Abastecimento de Água e Saneamento deste concelho.

 

A Águas do Sado contabiliza já dois milhões de euros em dívida, valores com uma antiguidade superior a seis meses.

 

No que diz respeito ao abastecimento de electricidade, fonte da EDP disse à Lusa que a empresa "não sente, por ora, sinais acentuados de dificuldades de pagamento de electricidade" por parte dos clientes, mas sem especificar o número de cortes de abastecimento por falta de pagamento.

 

"Nas situações de incumprimento, a EDP, cumprindo a lei, notifica o cliente para o facto de este estar em incumprimento, alertando-o para a sanção inerente (corte de fornecimento), e por fim, se a situação persistir, avança para o corte de energia", referiu apenas a empresa.

 

A Lusa sabe, contudo, que a empresa tem sido contactada por clientes que tentam pagar as contas de forma fraccionada, o que é, aliás, uma das propostas da Deco para estes casos.

 

Segundo Natália Nunes, da Deco, viver sem água e electricidade é um cenário "cada vez mais frequente", que resulta, principalmente, de casos em que o desemprego bateu à porta.

 

"São famílias que têm poucos e cada vez menos rendimentos, até que deixam de poder pagar bens como estes", disse, revelando que a Deco, nestes casos, tenta ajudar de modo a que o consumidor consiga pagar faseadamente as dívidas e possa, quanto antes, voltar a ter água e electricidade.

 

Até o conseguirem, explicou, estas pessoas vivem muitas vezes da ajuda de familiares e amigos, na casa de quem tomam banho. Outros, sem gás ligado, lavam-se com água fria.

 

Carlos Braga, dirigente do Movimento dos Utentes dos Serviços Públicos (MUSP), também tem conhecimento de "cada vez mais casos" de cidadãos que, por falta de pagamento, têm de viver sem água nem electricidade.

 

"São situações que põem em causa a sobrevivência das pessoas", disse Carlos Braga.

 

O dirigente do MUSP classifica de "insuficientes" as medidas que têm sido adoptadas pelas autarquias e responsabiliza-as por atribuir a empresas privadas a domiciliação da água.

 

"Estas empresas [privadas] só pensam no lucro e não levam em atenção as fragilidades dos cidadãos que, pelos mais variados motivos, podem deixar de honrar os seus compromissos", disse.

 

Lusa