Diário de Notícias - 6 Nov 05

"Política fiscal em Portugal é ostensivamente contra a família"

 

Como caracteriza as políticas da família em Portugal?

São péssimas. Não existem. O último relatório da OCDE indicava Portugal como um dos piores e sublinhava que os pais portugueses passavam mais tempo fora de casa. Dizia, nomeadamente, que as famílias devem ter a oportunidade de um dos membros do casal ficar em casa sem que tal prejudique o orçamento familiar. Deve- -se subsidiar directamente os pais e não as instituições.

Essa é a vossa reivindicação, a criação de um "cheque educação"?

Sim. Há um relatório que diz que o Estado gasta cinco mil euros por jovem/ano. Queremos esse dinheiro e acabe-se com o ensino gratuito. A matrícula nas escolas estatais custaria os tais cinco mil euros e as pessoas teriam possibilidade de escolher. Há escolas estatais muitíssimo boas e privadas muitíssimas más.

Os seus filhos estudam no público?

Tenho 13 filhos, entre os três e os 31 anos, sempre estiveram no ensino público. Quatro trabalham, oito estudam e apenas uma está numa universidade particular, porque não há um curso de educadora infantil no oficial. Não tenho possibilidade de os manter no particular, não tenho liberdade de escolha. E quem tem os filhos no particular está a pagar duas facturas a da escola e a do Estado.

Qual é a principal reivindicação?

É ao nível da política fiscal, que é ostensivamente contra a família. Basta as pessoas casarem para pagarem mais impostos. Se nos divorciarmos ou separarmos, podemos deduzir 7500 euros no IRS por filho/ano em despesas, não é necessário especificar. Apresentámos queixa no provedor de Justiça contra o Estado em Maio.

O que é que esperam deste Governo?

Os primeiros sinais são péssimos. Pela primeira vez em 22 anos não existe um Conselho Nacional de Família ou uma estrutura similar. Vão dar incentivos para a compra de computadores, em vez de "darem irmãos aos filhos". Não estamos mal no acesso à Internet, estamos péssimos na taxa de natalidade e de divórcio. Bonificam os PPR (planos poupança- -reforma), o que só beneficia o próprio. Ainda me falta muito para a reforma, mas já tenho quatro filhos a pagar pensões. Se o Governo português adoptasse as mesmas medidas que o francês, aumentava a taxa de natalidade. Os emigrantes em França têm, em média, 2,9 filhos por mulher.

Qual deveria ser o maior incentivo?

Criar um abono de família como deve ser. O Estado deveria actualizar esse valor, que vem de 1973, como fez com as pensões e propinas. Significaria que as famílias receberiam 120 euros por filho/mês, independentemente da situação económica. E deviam repor o subsídio de nascimento.

Outra reivindicação é a alteração da forma de pagamento do consumo de água. Como está esta situação?

Há seis anos que estamos a atacar as 307 câmaras e conseguimos a adesão de 14, algumas das quais só parcialmente. Os escalões da água são em função do consumo global - quanto mais se consome, mais se paga - e nós queremos que seja em função do número de pessoas do agregado familiar.

O Governo de Durão Barroso fez um documento intitulado 100 Compromissos para a Família. O que foi feito?

Nada ou quase nada, e havia um calendário para o cumprir até 2006. O documento resultou de um trabalho intenso, mas Durão Barroso foi para Bruxelas pouco tempo depois deste ser aprovado.

Insistem nos apoios à natalidade em vez das práticas laborais, porquê?

Em primeiro lugar, defendemos a despenalização, porque há uma política para tornar as crianças cada vez mais caras. É óbvio que a conciliação entre a vida familiar e a vida profissional é importante, mas primeiro temos de ter um abono de família em condições.

Mais do que defender a família, defendem um determinado tipo de família e de determinado estrato social.

Não perguntamos a classe social na inscrição e temos 4500 sócios. Claro que defendemos a família tradicional. É um direito universal da criança ter pai e mãe.

 

Fernando Castro
Pres. Assoc. famílias numerosas

 

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