Quando mais fala o Governo do TGV e da Ota,
mais incongruentes surgem ambos os projectos
Num frenesim nada esclarecedor, o Governo
tem vindo a "libertar" cirurgicamente
pedaços de informação sobre os projectos da
Ota e do TGV. O ruído é muito, a coerência
pouca, a evidência de que tudo está mal
pensado imensa.
Coloquemos, pois, algumas perguntas, para as
quais não encontrámos respostas coerentes.
Ou sequer tentativas de resposta.
O ministro diz que quer criar um comboio
rápido entre a Gare do Oriente e a Ota, o
qual permitiria aos passageiros chegar ao
aeroporto em 17 minutos. Para tal,
utilizaria a Linha do Norte, menos
sobrecarregada após a construção do TGV, mas
não esclarece como ligaria essa linha à Ota,
pois ela passa muito longe do novo
aeroporto. Também não esclarece se o seu
shuttle, futurista e sem condutor, circulará
metade do caminho na Linha do Norte, que tem
bitola ibérica, e outra metade na nova linha
do TGV, que tem bitola europeia. Já quem
conhece o "aperto" que constitui, para a
expansão da Linha do Norte, o "gargalo" de
Vila Franca de Xira, onde não há espaço para
meter nem mais uma agulha, interroga-se
sobre por onde passará a linha do TGV. Será
que vai ser necessário construir uma nova
ponte para o Barreiro para meter lá o novo
comboio, fazê-lo passar depois pela lezíria
- com que impacto ambiental? - e, após
tortuoso "esse", levá-lo até à Ota?
Outra questão sem resposta é a do tráfego
esperado na ligação Lisboa-Porto e quanto
tempo poupará uma linha de alta velocidade
face ao melhoramento da Linha do Norte. É ou
não verdade que, se os estrangulamentos nela
existentes forem eliminados, essa ligação
pode ser feita em duas horas e um quarto,
talvez menos? Sendo assim, vale a pena
investir num TGV para ganhar uns 20 minutos
na ligação Lisboa-Porto?
E, já agora, como pensa o Governo resolver o
problema da criação do corredor onde passará
o TGV, já que este terá de ter entre 500 e
mil metros de largura e estamos a falar da
zona do país mais densamente povoada?
Recordar-se-ão as doutas autoridades de como
foi difícil fazer passar um simples gasoduto,
com anos de atrasos nas expropriações? Terão
ideia de que rasgar um corredor para o TGV
corresponde a criar abrir um lenho no
território duas a três vezes mais largo do
que o de uma auto-estrada? Convinha não
esquecer que a orografia e a ocupação rural
e urbana do litoral português, para onde se
"entornou" quase toda a população do país,
pouco tem que ver com as planuras desertas
onde Espanha planeia fazer passar as suas
linhas de alta velocidade...
Falando de Espanha, será que podem
explicar-nos que tipo de linha tencionam "nuestros
hermanos" construir entre Madrid e a
fronteira? Olhando para os documentos
oficiais espanhóis, percebemos que será uma
linha mista, para passageiros e mercadorias,
a qual fica pelo menos 15 por cento mais
cara do que uma linha só para passageiros.
Ora nesses mapas essas linhas mais caras são
as que servem as regiões espanholas com
menos tráfego, o que não deixa de ser
misterioso. A não ser que, em vez de essas
linhas serem de alta velocidade, serem
apenas de velocidade alta... Nesse caso,
será que estamos a comer gato por lebre?
Poderá também o ministro explicar por que
vai construir uma linha de metro para o
actual aeroporto da Portela, se tenciona
desactivá-lo? Será que espera encher esses
apetecíveis terrenos de construções? Ou que,
destinando-os a um parque urbano, entende
ser útil levar o metro para um jardim,
quando há tantas zonas de Lisboa densamente
povoadas e mal servidas? E não estará a
mangar connosco quando sugere que vai propor
a realização de um concurso de ideias para
aqueles terrenos, quando eles têm de
reverter para os seus antigos proprietários
se deixarem de servir o aeroporto?
Por favor: não julguem que os portugueses
são tontos.