Diário de Notícias - 21 Nov 05

entrevista
Mariano Gago MINISTRO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR
elsa costa e silva
"Há instituições que poderão ter outra função"

Ministro recusa falar em fecho de universidades e politécnicos, mas alerta algumas terão de transformar-se radicalmente

objectivo.
"Quero que o sistema de ensino superior seja mesmo bom"

A questão da empregabilidade parece ser muito importante na avaliação do ensino superior.

O mais importante é que o ensino superior português seja qualificado no espaço europeu. Isso tem obviamente impacto sobre a empregabilidade, a nível do que tem sido discutido no Processo de Bolonha. Há uma grande concorrência no mundo por recursos humanos e empregos qualificados. E é muito importante que o ensino superior português seja concorrente a nível europeu. As pessoas podem pensar que este problema só se coloca para quem vai para fora, mas não é bem assim. O emprego dentro de cada país vai, cada vez mais, ser sujeito a mecanismos de recrutamento internacionais, e por isso são essenciais sistemas de acreditação à escala europeia. O impacto da avaliação internacional sentir-se-á no mercado de trabalho como um todo, interno e europeu. Este processo terá também um impacto na credibilidade externa de Portugal, que depende da formação de recursos humanos qualificados.

E quanto ao sistema?

Quero que o sistema de ensino superior seja mesmo bom. Que os seus elementos que já são bons, continuem. Que os menos bons, melhorem. Que alunos saiam do ensino superior mais preparados. E isso é conseguido com uma avaliação externa e independente, feita por pessoas com experiência, que podem ajudar a nível do sistema e da sua organização. É o que vai fazer a OCDE e é o que vai acontecer também a nível da montagem interna do sistema de acreditação, a que Bolonha também conduz. Por isso envolvemos a agência europeia, esta tem de estar envolvida na acreditação nacional.

Temos também o nível das instituições.

As instituições, por seu lado, também poderão ser avaliadas através de acordos com a EUA. É preciso que possam, autonomamente e de uma forma regular, pedir avaliação internacional, publicá-la e discuti-la.

Mas isso será apenas uma submissão voluntária?

Sim. Mas é essencial também para fornecer informação de detalhe à OCDE. Não era possível, nesta fase, promover a avaliação de todas as instituições. De acordo com a EUA, podemos esperar que neste próximo ano sejam aferidos dez estabelecimentos de ensino, e isso já é um bom ritmo. Espero que, num futuro próximo, com a revisão da lei da avaliação do ensino superior, se encontre um mecanismo regular e periódico para avaliar todas as instituições que forem acreditadas.

Que consequências podemos esperar dessa avaliação para as instituições?

Do processo global realizado pela OCDE, as consequências serão mais ao nível da política de ensino superior, porque ajudará a determinar os mecanismos de regulação.

Também de financiamento?

Na regulação do financiamento, sim, a nível, por exemplo, da autorização de abertura e encerramento de cursos, da continuação das instituições...

Há instituições que podem não continuar, portanto, fechar?

Falando genericamente, lembro que nada é eterno. Mas não digo que podem fechar instituições, porque não queremos desperdiçar os recursos investidos, mas poderão sim transformar-se radicalmente assumir outra natureza ou ter outra função. Isto não deve ser visto como um drama, mas como uma necessidade. Não podemos admitir um sistema relativamente ao qual haja dúvidas de razoabilidade e em que nada aconteça.

É o que se passa actualmente?

É o que acontece neste momento. Em várias áreas temos um grande número de cursos idênticos, que gerem enorme investimentos e nem sempre com os recursos humanos apropriados. O problema tem vindo a colocar-se porque não há procura suficiente por parte de alunos. Vai ser indispensável juntar recursos e racionalizar o sistema. Penso que muitas instituições, sobre as mais pequenas, terão uma absoluta necessidade de se especializarem. Mas isso sem correr o risco de ter uma outra ao lado com a mesma oferta. Há hoje uma necessidade de solidariedade entre Estado e instituições para reorganizar a rede de ensino superior.

É neste âmbito que se inscreve a distinção entre politécnico e universitário?

Tenho a absoluta convicção, pela experiência que se vive a nível da Europa, que é muito importante ter bons politécnicos e boas universidades. São ensinos de natureza diferente, com saídas profissionais diferentes.

Mas tem havido uma certa tendência de uniformização entre ambos.

Houve em muitos casos uma ideia não razoável de que o desenvolvimento do politécnico levaria aos seu desaparecimento e transformação em universidade. Isso é uma ideia extraordinariamente negativa. Um bom politécnico deve ter no seu horizonte um bom politécnico na Finlândia ou na Suécia. Esse é o seu termo de comparação. Tal como um bom curso universitário tem como termo de comparação cursos da mesma área de outros países.

 

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