Duas investigadoras doaram células sob nomes
falsos, disse ontem Woo-Suk Hwang
publicamente, reconhecendo o erro
Woo-Suk Hwang, o investigador coreano que
pela primeira vez produziu células
estaminais a partir de embriões criados de
propósito para o efeito, demitiu-se ontem de
todos os cargos oficiais. Assumiu a
responsabilidade por ter agido contra as
regras éticas da investigação, ao aceitar a
doação de ovócitos para as experiências de
jovens investigadoras da sua equipa.
A pressão sobre Hwang tornou-se enorme,
depois de o investigador norte-americano
Gerald Schatten, que se uniu ao sul-coreano
para criar um centro de investigação sobre
células estaminais em Seul, ter anunciado
que cortava todos os laços com ele por ter a
certeza de que tinha usado a doação de
células de cientistas que trabalhavam sob a
sua alçada. Isto não é aceitável, porque
pessoas numa posição de autoridade, como
Hwang, não devem aceitar doações de tecidos
de colaboradores. A ideia é evitar abusos ou
actos de coacção por parte de alguém com
poder e este princípio é aceite
internacionalmente.
Esta semana, um médico do hospital Miz Medi,
em Seul, já tinha reconhecido que pagou, do
seu próprio bolso, os ovócitos usados nas
experiências que deram origem ao artigo
publicado na revista Science, no início de
2004, dando conta da clonagem de embriões
humanos para colher células estaminais. Sun
Il Roh, que é também co-autor do artigo na
Science, admitiu ter pago perto de 1500
dólares a cada uma das 20 mulheres cujos
ovócitos foram usados na experiência. "Não é
muito dinheiro, considerando que tiveram de
receber injecções diariamente durante oito a
dez dias."
Pagar pela doação de ovócitos não era ilegal
na Coreia do Sul em 2003, quando foram
feitas as experiências, mas passou a sê-lo
em Janeiro de 2005. E Roh garantia que Hwang
não sabia como tinham sido obtidos os
ovócitos.
Só que as televisões e jornais sul-coreanos
começaram a investigar o que se tinha
passado, até porque Hwang se tinha
transformado num herói nacional.
Foi assim que o investigador se viu obrigado
a confessar que algumas investigadoras da
sua equipa tinham doado os seus ovócitos
para fazer as experiências. Continua a
afirmar, no entanto, que isso aconteceu sem
a sua autorização.
Reconheceu também que algumas mulheres
receberam pagamento pelos ovócitos, embora
também sem o seu conhecimento. "Precisávamos
de muitas células, mas não havia ovócitos
suficientes", explicou Hwang. Foram precisos
242 ovócitos para clonar os embriões que
deram origem às primeiras culturas de
células estaminais embrionárias criadas de
propósito.
"Sinto-me
muito envergonhado"
Mas o cientista admitiu que mentiu, quando
começaram a surgir questões sobre a
proveniência das células usadas para criar
embriões. "Sinto-me muito envergonhado por
ter de confessar estas coisas vergonhosas e
miseráveis", disse Hwang. "Peço sinceras
desculpas por ter causado tantos problemas
no meu país e no estrangeiro."
No entanto, garante que, quando duas das
investigadoras que trabalham com ele se
ofereceram para doar os seus ovócitos,
recusou a oferta. Mas elas doaram-nos na
mesma, sob nomes falsos, explicou Hwang. Diz
que acabou por descobrir a marosca, mas que
mentiu, em declarações públicas, a Gerald
Schatten e nos artigos científicos, porque
as investigadoras lho pediram. "Não pude
ignorar o pedido veemente que me fizeram
para proteger a sua privacidade."
Este escândalo não invalida o trabalho da
equipa de Hwang. O cientista disse que ia
continuar a trabalhar na área, embora se
tenha demitido de director do centro de
investigação de células estaminais, criado
no mês passado para fornecer culturas destas
células a investigadores em todo o mundo que
quisessem estudá-las.
O Governo sul-coreano, no entanto, continua
a apoiar Hwang. Um porta-voz do Ministério
da Saúde disse que as doações de ovócitos
das investigadoras não eram propriamente
contra a lei, porque foram feitas de forma
voluntária - embora contrariem os princípios
éticos aceites internacionalmente.
"Aprendi uma lição dolorosa: devo conduzir a
minha investigação de uma forma calma e
cautelosa, cumprindo os princípios que são
aceites a nível global", disse Hwang.