Alameda Digital - 6
Nov 06
O aborto é fixe,
o puto que se lixe
A hipocrisia do Sim
J. Luís Andrade
Sempre que
alguém se manifesta pelo primado da Vida contra a
banalização do aborto, um bem orquestrado coro de
vozes, vem sistematicamente encher-nos os ouvidos
com a palavra hipocrisia.
A sua
arrogância petulante, tolda-lhes a lucidez e impedem
que se revejam no espelho da Razão. Que epítetos
devemos atribuir aos que com descaramento inaudito,
auto - intitulados defensores dos pobres e
oprimidos, vêm advogar a opção do Direito do
mais forte sobre o mais fraco e indefeso?
Que nome
devemos chamar aqueles que mentem com todos os
dentes que têm na boca ao propalar estatísticas
de práticas abortivas ilegais, sem qualquer suporte
de registo, ignorando ao mesmo tempo a realidade,
essa sim suportada por dados oficiais, do aumento do
número de aborto nos países em que a legislação o
despenalizou?
Qual o termo
para designar aqueles que sabem que o recurso ao
aborto é maioritariamente uma prática das classes
médias aburguesadas que se regem por aparências e
conveniências, figurantes convictos da sociedade do
Ter e do Parecer, enquanto que nas classes
economicamente mais desfavorecidas o Ser (e logo o
instinto maternal) tem um relevo diferente?
Qual o
adjectivo a usar para com aqueles que, sabendo muito
bem que com as actuais drogas e fármacos os abortos
de perna aberta começam a ser coisa do passado, nos
continuam a agredir psicologicamente com o mito (e o
imaginário) do número crescente de abortos
clandestinos?
E que pensar
dos jornalistas, pretensamente isentos, que,
servindo-se do seu privilegiado púlpito, colaboram
consciente e militantemente na censura,
desinformação e boicote de quem defende as posições
pró-Vida?
Será que a vida
de uma baleia, de um touro ou de uma cegonha é mais
importante que um ser humano? Como diz Gentil
Martins “biologicamente a vida é um todo contínuo,
de que a permanência no ventre materno não é mais do
que um estádio”.
Não deixa de
ser irónico que aqueles que sempre usaram o primado
da Ciência na afirmação do modelo social venham
agora ignorar a realidade que a experimentação
médico - biológica aponta.
Os mais
esclarecidos já perceberam que perderam a guerra no
que diz respeito à questão científica. Demarcando-se
dos militantes do tipo O Aborto é fixe! - o puto
que se lixe, característico das abencerragens
comunistas e feministas integradoras do Bloco de
Esquerda, vêm agora, mudando de táctica, virar os
focos para a mulher e para as definições jurídicas
sobre o que é ou não uma pessoa, manifestando
farisaicas preocupações humanísticas e sociais. Na
realidade, tentam escamotear aquilo que está por
detrás de todas essas posições - uma distinta e
inconciliável visão da Vida humana e
consequentemente da própria Humanidade. Não se trata
de um problema de convicções religiosas mas sim de
um referencial ético. Quem assume a posição pró-Vida
está consciente de que se trata de um ser humano,
essência da própria Vida que importa defender como o
valor mais sagrado. Eles acreditam que é apenas um
apêndice do corpo da mãe que sobre ele dispõe de
todos os direitos enquanto for seu hospedeiro como
se de um tumor se tratasse. A gravidez é para eles
um empecilho nas conquistas da mulher para
a Igualdade face ao homem.
Aos que pugnam
pela Vida, a opinião publicada que nos
tentam impingir como opinião pública acusa-os de
dogmáticos e insensíveis perante os dramas e
aflições das mães grávidas. Para eles que na prática
só se preocupam com o que chamam o bem-estar e os
direitos sexuais da mulher, a solução mais lógica e
mais fácil é o aborto, agora eufemisticamente (e
hipocritamente) atenuado na sigla IVG. Como se não
se tratasse de uma terminação e houvesse a
possibilidade de retomar a gravidez após a
interrupção. Tal hipocrisia na designação é aliás
sinal de medo e necessidade de esconder a verdadeira
natureza do acto.
Pela sua
natureza ética, o tema do aborto é metapartidário
embora fortemente concentrado nos que não se revêm
numa matriz totalitária ou centralista da sociedade.
E os números do referendo passado não são assim tão
escassos para que os partidos que agora cederam a
agendar uma nova consulta para 2007 os ignorem.
Mas é
importante notar que no seio dos movimentos que
promovem uma cultura de Vida, não é altura para
grandes competições de pureza. É compreensível que
muitos sintam que a Vida se não referenda mas ou vão
à liça, mesmo sabendo que o fazem sob regras ditadas
pelo adversário, ou não perturbam. O que se avizinha
é um combate que tem por objectivo estratégico único
ganhar o referendo. E para isso todos os que os que
não estão de acordo com a actual lei ou que,
aceitando-a, se recusam a mais condescendências no
caminho para a liberalização total do aborto, têm de
estar na mesma frente, no mesmo lado da barricada. É
esse o verdadeiro e único objectivo. É essa a
próxima batalha que se aproxima na guerra contínua a
favor da Vida e que urge ganhar. Definir a
estratégia, concertar as tácticas e escolher os
operacionais mais adequados a cada tarefa,
nomeadamente no que diz respeito às capacidades
comunicativas, são tarefas fundamentais que, a serem
executadas com rigor, poderão fazer toda a diferença
num país altamente condicionado por décadas de lixo
ideológico que gosta de brandos costumes e suaves
posições.