Público
- 27 Out 07
Lei britânica faz este fim-de-semana 40 anos
Reino Unido: pai da lei do aborto diz que IVG é
usada como meio contraceptivo
Ana Machado
Tinha apenas 29 anos quando ficou conhecido por ter
legislado sobre um dos temas mais quentes na
política em todos os tempos: o aborto. Em 1969 David
Steel, escocês, filho de um ministro da igreja,
ficou conhecido como o pai do Abortion Act, o
primeiro diploma da Europa democrática a regular a
prática da interrupção da gravidez. Apesar do Reino
Unido permitir, desde então a interrupção da
gravidez primeiro até às 28 depois até às 24
semanas, Lord Steel afirma que se sente hoje triste
e considera que a lei está a ser usada como uma
forma de contracepção.
Democrata liberal, Steel confessa, numa entrevista
dada esta semana ao britânico "The Guardian" que
estava longe de pensar que a legalização do aborto
faria com que os números de interrupções da gravidez
disparassem de tal maneira no Reino Unido.
Em 2006 registaram-se 194 mil abortos no Reino
Unido, números que superam os 200 mil se se
quantificarem os casos vindos da Irlanda do Norte,
onde o aborto é proibido e que acabam por ser feitos
em Inglaterra. Isto significa um aumento de 4 por
cento em relação ao ano anterior e o que preocupa
mais as autoridades britânicas é que a prática está
a aumentar especialmente entre as adolescentes.
"Todos concordamos que há abortos a mais", disse,
adiantando que se devia investir na educação sexual
e no aconselhamento sobre a contracepção. "Há um
sentimento geral de irresponsabilidade entre as
mulheres que acham que podem recorrer ao aborto se
as coisas correrem mal". Isso, acrescenta, não era a
intenção de uma lei, feita há 40 anos para parar com
o flagelo da morte de mulheres em abortadeiras
clandestinas e dos suicídios.
Numa altura em que o tema voltou a ser debatido no
país, com uma reforma da lei na agenda, Steel
adianta ainda que a actual posição da igreja em
relação à contracepção é a principal culpada pelo
facto de se encarar o aborto, ele próprio como um
método contraceptivo.
Para Albino Aroso, o médico que inaugurou a primeira
consulta pública e gratuita de planeamento familiar
em Portugal, no Hospital de Santo António, no Porto,
o caso inglês é muito particular: "Não me parece que
esta afirmação seja justa. Inglaterra tem uma
estrutura muito avançada de planeamento familiar
montada", afirma, justificando o crescendo de
interrupções da gravidez com o "grande número de
mulheres imigrantes que ocorre a Inglaterra de há 40
anos para cá".
Para Albino Aroso as concepções sobre a interrupção
voluntária da gravidez têm mudado muito ao longo dos
anos e é natural que, passados 40 anos, no Reino
Unido o debate também se instale, descartando a
hipótese de, daqui a 40 anos, os autores da lei
portuguesa estarem a pensar o mesmo que David Steel.
"Daqui a 40 anos tudo vai ser diferente. Será que a
idade da fertilidade se prolongará por tanto tempo
como hoje? A tendência é para que a mulher engravide
quando quiser", avança, sugerindo que, talvez, daqui
a 40 anos a questão de uma gravidez não desejada não
se coloque.