

Como
sabemos, são inúmeros os problemas da família, mas o problema
económico não é o último, nem o de menor gravidade: constituir hoje
em dia uma família significa, segundo as estatísticas europeias,
aumentar as despesas de, pelo menos, 30% para o primeiro filho até
aos sete anos e de 44% para esse mesmo filho a partir desta idade,
não tendendo esse aumento a diminuir com o passar do tempo. Na
década de 90, o aumento das despesas de um núcleo familiar com dois
filhos pequenos foi de cerca de 52% e o de um com dois filhos
adolescentes, de 67%. As despesas com os filhos pesam de tal forma
no rendimento dos casais que tornam evidentes os motivos da
dramática redução dos nascimentos na Europa, que muitos definiram
como "apocalíptica".
A primeira pergunta é a seguinte: para ser pai é necessário ser-se
herói?
Os estudiosos que convidámos informar-nos-ão sobre a situação na
Itália e no estrangeiro, pelo que lhes dou a palavra na qualidade de
peritos; gostaria, contudo, de sublinhar que ninguém que queira
verdadeiramente governar a sociedade pode evitar debater-se com o
carácter central dos problemas da família, entendida no seu
significado ordinário, quotidiano, como "Instituição" e como sujeito
económico forte e insubstituível que permitiu às outras instituições
vencerem as dificuldades dos últimos anos.
Os pais italianos transformaram-se, de forma constante, lenta e
inexorável, em sujeitos económicos que, face à rigidez do mercado e
dos serviços, se tornaram formidáveis amortecedores sociais. Em
Itália, 67,6 % das fontes de rendimento dos jovens com idades
compreendidas entre os 20 e os 30 anos (Fonte: Eurobarometer 1997)
provêm da família, contra 45% da média europeia, enquanto em Itália
apenas 3,4% das despesas sociais são consagradas à família, contra
69,6% destinados às pensões. Uma disparidade que não se verifica em
mais nenhum país comunitário. Um de cada sete menores vive abaixo do
limiar da pobreza, estando esta, particularmente no Sul,
directamente ligada ao número de filhos e, na Itália das 1000
garantias e do Estado social hiperprotector, as crianças são uma das
categorias em maior risco.
A segunda pergunta é a seguinte: são as democracias contra as
crianças? Talvez por não terem voz política? Os jovens e os idosos
encontram-se numa situação de conflito potencial, sobretudo em
Itália, país que regista o processo de envelhecimento mais acelerado
da Europa, tendo em conta o baixíssimo nível dos nascimentos: que
fazer?
Em minha opinião, a resposta só pode estar numa decisiva e rápida
inversão de tendência, que redefina a solidariedade das gerações e
deixe de penalizar a família pelo simples facto de existir.
Não é possível privilegiar as gerações presentes em detrimento das
futuras, ou a despesa social tornar-se-á insustentável devido à
redução demográfica drástica. Além disso, não se pode continuar a
deixar de reconhecer que a função de solidariedade primária exercida
pela família só pode realizar-se de facto e de direito mediante um
sistema fiscal que deixe às famílias uma parte dos recursos por elas
produzidos, com a convicção do papel insubstituível que desempenha.
Pelo contrário, o efeito combinado de impostos directos e indirectos
mostra que a solidariedade exercida pelas famílias é considerada
completamente inútil, enquanto não for ultrapassada a ideia redutora
segundo a qual as únicas famílias com direito a apoio são as
famílias pobres e numerosas. Não me cansarei de dizer que as
famílias pobres devem ser ajudadas com políticas ad hoc que são de
políticas de combate à pobreza, e não políticas da família; as
políticas da família têm um carácter universal e reconhecem a
família como recurso para toda a sociedade, independentemente do
rendimento.
O desafio a lançar é o seguinte: como pode um país manter-se
próspero e competitivo com uma taxa de envelhecimento e de
participação para o mercado de trabalho que se contam entre as mais
elevadas do mundo?
São necessárias fantasia, coragem, vontade política, reformas
sérias, propostas novas e originais; são necessárias muitas coisas,
talvez mesmo novos sacrifícios, mas o repto consiste na fusão de
todas as ajudas do Estado providência para activar um círculo
virtuoso capaz de conciliar entre si prosperidade económica,
sociedade do conhecimento e os respectivos investimentos de
informação e um novo critério de solidariedade social.
Neste sentido, constituem um exemplo interessante algumas
iniciativas normativas desenvolvidas pela Região da Lombardia em
Itália.
A lei-quadro regional sobre a família é a lei 23/99: “Políticas
sociais para a família”, com a qual a Região da Lombardia traçou uma
nova via no âmbito das políticas sociais. Antes desta lei, o
associativismo familiar não era, de forma alguma, relevante. No
espaço de três anos, o associativismo familiar decuplicou e os
projectos passaram, em três anos, de cerca de 80 para 1.100, com a
assistência e a garantia certificada e de alta qualidade. Com esta
lei, a Região não pretende fornecer serviços aos sujeitos que
compõem a família, mas refere-se ao núcleo familiar enquanto tal e
enquanto componente primário da sociedade civil.
O ponto de partida para a reflexão política regional baseia-se num
conhecimento das famílias que vivem na nossa região. Na Lombardia, a
família é um sistema vital aberto, em sintonia com a mutação social,
em contínua inter-relação dinâmica entre história, evolução e
mudança dos seus componentes, e dos seus modelos de relação e de
convivência. Estas modificações de contexto constituem uma realidade
complexa e múltipla que as políticas sociais deveriam ter em
consideração, a começar pelo apoio das relações recíprocas de
partilha e ajuda entre as pessoas que compõem a família.
É necessário dar, nas políticas sociais, uma absoluta prioridade às
famílias que assumem funções especiais na prestação de cuidados,
mediante a redistribuição dos recursos colectivos, em especial no
que se refere às famílias económica e socialmente desfavorecidas,
sendo igualmente importante promover as potencialidades das famílias
capazes de ser sujeitos portadores de recursos próprios e de
propostas políticas e sociais significativas.
A actual opção realizada pela Região da Lombardia nesta linha de
política social tem relevância não só para a família, mas sobretudo
para a sociedade, com o objectivo de prevenir o risco de uma
sociedade desestruturada em que prevaleçam o individualismo, o
edonismo e a solidão. A opção no sentido de reconhecer, com firmeza,
o novo papel social da família representa uma inovação gerada pela
necessidade de ultrapassar a velha cultura de participação a nível
público, onde a instituição pública “faz política” e as famílias e
os cidadãos são reduzidos a um papel residual de controlo genérico.
Na nova cultura da participação, a instituição pública redefine o
seu papel, passando de “gestor de tudo” a “programador” e legislador
das sinergias, com a consciência de que a qualidade da vida social é
o resultado da combinação entre a qualidade da vida familiar e a
qualidade das relações que as famílias desenvolvem na comunidade em
que estão inseridas. Uma sociedade civil e madura, como a da
Lombardia, é capaz não só de receber, mas também de produzir
serviços e solidariedade, se aplicado de forma correcta o princípio
de subsidiariedade. Por este motivo, a lei regional 23/99 reconheceu
um papel específico das associações familiares como partes civis que
exprimem e defendem os direitos da família.
Ajudas financeiras e "voucher”
A disposição mais significativa desta repartição, é o “voucher
socio-sanitário”. É constituído por um cheque mensal concedido a
idosos de mais de setenta e cinco anos de idade e não autónomos para
a aquisição de prestações de saúde alternativas à cobertura R.S.A.
(prestada em residências de assistência sanitária a idosos). Na
prática, a família é ajudada na prestação de assistência ao próprio
idoso sem se ver obrigada a hospitalizá-lo, mas sem ficar entregue a
si mesma no que se refere aos cuidados. Desta forma, também neste
sector é aplicada a liberdade de escolha. Além disso, trata-se de
uma disposição que permite aliviar a pressão sobre os lares da
terceira idade e economizar os recursos das caixas da Região.
Com a redução dos juros dos empréstimos para aquisição da primeira
casa concedidos aos jovens casais, pretendeu-se apoiar a família na
fase mais delicada, a da construção da habitação.
Com as ajudas em favor das associações familiares, tentou-se
favorecer o desenvolvimento de uma “parceria” que se concretize na
resposta às necessidades. As ajudas permitiram, assim, às
associações criar numerosos projectos, desde “bancos do tempo”, às
creches familiares e até às “creches-empresa”, indispensáveis para
conciliar as necessidades suscitadas pelo nascimento e o
desenvolvimento do núcleo familiar com as necessidades suscitadas
pelos compromissos de ordem laboral.
Os “empréstimos de honra” e os financiamentos às famílias com
pessoas com deficiência para a aquisição de equipamento
tecnologicamente avançado, aparecem como intervenções sem carácter
de assistência em apoio à resolução das dificuldades existentes nos
núcleos familiares.
Por último, o “cheque escolar”: para reconhecer às famílias o
direito à liberdade de escolha em matéria educativa, direito
fundamental da pessoa humana, que o poder público é chamado a
reconhecer e a promover para todos, com mais ou menos recursos,
inscritos no ensino público ou privado e nas escolas cívicas ("scuole
civiche") , teoricamente nas mesmas condições.
[anterior] |
Outros artigos
Editorial
Comunicado da APFN a
propósito do dia 15 de Maio - Dia Internacional da Família
"+Famili@ na Educação" no
Funchal, Vila Real, Elvas e Faro
Protocolo entre a Galp e a APFN
Apontamentos para um convénio
sobre a Família
Presidente
da
Associação Húngara de Famílias Numerosas em Portugal
"+Famili@ no fortalecimento do
tecido social" , em Évora, por Eugénio Gamboa
Conferências realizadas
no dia 15 de Maio, todas às 21 horas
|