A MULHER E O FUTURO DA PATERNIDADE

Barbara Dafoe Whitehead*

Grande parte do nosso debate contemporâneo sobre a paternidade assenta no preconceito segundo o qual o homem é capaz de solucionar sozinho o problema da paternidade.
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Certamente que, ao darem sinais do seu compromisso em aceitarem a responsabilidade de criarem os seus filhos, os homens deram o primeiro passo essencial. Mas o que ainda não foi aceite é que o sucesso de qualquer esforço no sentido de reavivar a paternidade como facto social e norma cultural também depende da opinião e atitude das mulheres. Os homens não podem ser pais a não ser que as mães dos seus filhos o permitam. Apenas referimos este facto para mostrar até que ponto a rotura conjugal tem enfraquecido a ligação entre pais e filhos. Mais de metade das crianças americanas estão sujeitas a passar pelo menos uma parte da sua vida no lar do pai ou da mãe. Uma vez que a esmagadora maioria dos filhos de casais separados vive com a mãe , o pai não partilha a casa nem a vida quotidiana com os filhos. Para os pais, torna-se muito mais complicado organizar aquelas pequenas actividades rotineiras que ajudam a construir um bom relacionamento com os filhos. É difícil concertar o pneu furado da bicicleta ou dar banho quando se vive noutro bairro ou noutra cidade. A contribuição prática de muitos pais reduz-se ao envio de dinheiro por via postal ou electrónica ou, com demasiada frequência, a absolutamente nada. Os homens também reduzem muitas vezes as suas contribuições sentimentais sem o contacto regular com os seus filhos. Os pais devem-se esforçar por manter os laços sentimentais ao longo do tempo e do espaço, "estar lá" emocionalmente sem que se encontrem lá fisicamente. Alguns fazem a sua chamada telefónica, mandam um postal de aniversário ou compram um presente, mas, para muitos deles, a ausência física também passa a ausência emocional.

Sem casamento, os homens também perdem o acesso à sabedoria social e emocional da mulher na construção de relacionamentos. As mulheres ensinam os homens a cuidar dos bebés e também estimulam as crianças a amar os seus
pais. As mães que não vivem com o pai dos seus filhos provavelmente não procedem como as mães casadas que o apresentam aos filhos de forma positiva.

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Se o futuro da paternidade depende do casamento, todavia, o seu futuro é incerto. O casamento depende igualmente das mulheres e dos homens, estando aquelas, hoje em dia, menos voltadas para o casamento do que em qualquer período da história da nação. No passado, as mulheres foram economicamente dependentes do casamento e assumiram uma responsabilidade desproporcionalmente pesada para manterem o vínculo, mesmo que o relacionamento subjacente estivesse sério ou irremediavelmente deteriorado.

Contudo, no último terço do século XX, como as mulheres tiveram maiores oportunidades de conseguir um emprego pago e viram aumentada a disponibilidade de infantários, ficaram menos dependentes do casamento como forma de sustentação económica. Ainda que não seja fácil, é possível às mulheres criarem os filhos sozinhas. Isto fez com que o divórcio se tornasse muito mais atractivo como um remédio para um casamento insatisfatório e um número crescente de mulheres tenha extraído vantagem da opção.

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A debilitante ligação da mulher ao casamento não deve ser encarada como uma falta de interesse pelo casamento ou pela parceria marido-mulher na criação dos filhos. Pelo contrário, é um sinal dos padrões emocionais mais exigentes das mulheres para com os maridos e da crescente persistência para que os
homens participem em maior grau na criação dos filhos e da família. Dada a sua dupla responsabilidade como ganha pão e mães, muitas mulheres com emprego acham a necessidade de reforço do ego do homem e outras formas de manutenção emocional e física aborrecidas, para além do seu fracasso na
partilha do trabalho doméstico e na custódia dos filhos, que consideram absolutamente enfurecedores.
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" Se as mulheres solteiras podem fazer sexo, ter as suas próprias casas, o respeito dos seus amigos e um trabalho interessante, não têm necessidade de dizer a si próprias que qualquer casamento é melhor do que nenhum. Porque não ter um filho sozinha? As crianças são uma alegria. Muitos homens não o são."

Por todas estas razões, é importante ver o problema da paternidade como parte do vasto problema cultural do declínio do casamento como um relacionamento entre homem e mulher. O acordo tradicional entre homem e mulher foi quebrado, e ainda não foi celebrado um novo contrato. É impossível prever como será o novo acordo ou se existirá um. Contudo, é possível especular acerca dos pontos em agenda que podem levar as mulheres à mesa das negociações. Primeiro, uma cláusula crucial: deverá ser reconhecida a mudança do estatuto social e económico da mulher. Bem ou mal, muitas mulheres receiam que o movimento em favor da paternidade represente um esforço no sentido de reinstalar o anterior status quo, para rejeitar os ganhos que as mulheres fizeram nos últimos 30 anos e regressar à ideologia doméstica de "esferas separadas" que colocou os homens no lugar de trabalho e as mulheres em casa. Qualquer esforço para repensar o casamento deve aceitar o facto de que as mulheres continuarão a trabalhar fora de casa.

Portanto, deverá ser acertado um novo acordo sobre a divisão do trabalho pago e do trabalho familiar. Isto não significa necessariamente uma divisão 50/50 do trabalho em cada simples dia, mas significa que os homens deverão fazer um esforço determinado e consciente para executarem mais que um terço das tarefas domésticas. A forma como cada casal vai chegar a um acordo justo irá, certamente, variar, mas o objectivo é estabelecer um entendimento e um compromisso mútuos que conduzam a uma divisão equitativa das tarefas.

*Foi a investigadora convidada no Wilson Center, autora de "The divorce of culture" (Alfred Knopf, 1997).
Traduzido com a autorização da autora de " Wilson Quarterly, primavera 1996, pg. 30 a 34
© by Barbara Dafoe

Publicado na revista "Nova cidadania", nº5 Julho/Setembro 2000,
dossier " Família! Duras Realidades Novos Desafios" pg 27-31

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